“O tempo é o melhor autor; sempre encontra um final perfeito.”
Minhas malas já estavam feitas em casa. Iria morar sozinho em Primavera. Encontrar algum trabalho por lá. Ficar perto da Yasmin.Encarei mais uma vez a carta na minha mão, na Casa Secreta. Levantei os olhos para o céu e lá estavam as estrelas me arrancando um suspiro profundo. Despedir-me daquele lugar era tudo o que eu não queria ter que fazer tão logo, mas ficar longe da Yasmin eu queria muito menos.
Ela se manteve sendo apenas minha amiga, quando mais precisei e quando tudo o que ela queria era ser muito mais do que apenas a minha amiga. Eu podia fazer o mesmo por ela. Já tinha decidido.
Meus pais não estavam satisfeitos, mas eles sempre gostaram de nos deixar com bastante liberdade para fazer nossas escolhas. Eles eram os melhores.
Fechei os olhos. O aroma da noite e o som das folhas sendo levadas pelo vento cativaram a minha atenção por pouco tempo.
“Cinco filhos.”
“Tudo isso?” perguntei em meio a risos.
“Claro. Quero a casa sempre cheia. Imagina só todos eles lorinhos com esses seus olhos lindos! Dá vontade de ter até mais.”
“Prefiro que tenham os seus olhos e o seu jeitinho.”
Seu sorriso aumentou.
“E onde a gente vai morar? Com tantas crianças não podemos morar em qualquer lugar.”
“Aqui. Em Primavera. Em outro país. Onde você quiser, amor.”
“Então a gente pode fazer que nem a sua família e ter uma casa em todo lugar!”
“Eu só ainda não sei o que fazer da vida... Com essa família enorme vou precisar de um emprego muito bom.”
“Até lá você vai encontrar alguma coisa que goste, bebê, tenho certeza.”
“Eu já me sinto tão feliz e ainda falta tanto pra tudo isso acontecer...”
Ela salpicou beijinhos estalados pelo meu rosto. Depois me encarou, deitada por cima de mim. Perdi o fôlego com aquela imagem, a noite mais linda de todas tinha se tornado a moldura do sorriso do meu amor.
“Você é mesmo de verdade? Ainda acho que se eu fechar os olhos por tempo demais você vai desaparecer.” Ela disse fazendo carinho na minha cabeça.
“Eu não vou pra lugar nenhum sem você.”
“Que bom, porque eu não quero ter que descobrir o que faria sem você.”
Puxei-a e beijei seus lábios.
Naquele tempo achei que fosse ser impossível amá-la ainda mais. Como também acreditei que nossos sonhos não se tornariam algo tão improvável.
Abri meus olhos e me arrependi assim que o fiz. O vazio se tornou óbvio demais. Fechei meus olhos mais uma vez, prolongando o quanto pudesse aquela despedida.
“Já tem um milhão de chamadas não atendidas no meu celular da galera, Deri. Eles vão surtar se não formos logo pro Narciso’s.”
“Não, não... Ainda não. Vem cá. Eles esperam.” Rolamos pelo chão aos beijos.
“Meu Deus, Derick! Como vamos nos encontrar com eles nesse estado?” ela disse entre beijos. Ela tinha folhas secas por todo cabelo. Riamos como dois bobos.
Eu não podia mais continuar com aquilo. Levantei do chão. Já estava ficando muito tarde e eu não queria chegar de madrugada em Primavera.
Fui para o mesmo lugar onde tínhamos nos encontrado pela primeira vez ali. Olhei para as paredes velhas sem saber quando as veria novamente.
“Oi...”
Estremeci. Exatamente como na primeira vez. O som de sua voz foi tão real.
Virei para finalmente partir. Não era possível. Ela estava ali mesmo, na minha frente. Tão linda como sempre. “Yasmin...”
“Minha mãe precisa cuidar dos negócios da família agora e vai ficar ocupada demais pra mim. Minhas aulas só recomeçam ano que vem. Meus amigos estão todos aqui. Então eu vim.”
“Mas como você me achou aqui?”
Ela se aproximou de mim, sorridente. “Algo incrível aconteceu, Derick. Quando eu cheguei na minha casa aqui e abri a porta eu te vi.”
“Me viu?”
“Isso. Eu também fiquei surpresa. Você falava sobre um ensaio da banda. Depois você sumiu e apareceu de novo. Várias vezes. Tão rápido. Eram lembranças. Lembranças tão confusas e pedaços tão pequenos... Saí de casa um pouco assustada. E vim parar aqui. Vi você lá de baixo, cheguei a pensar que era alguma outra lembrança. Foi tudo tão real... Mesmo que também tudo rápido. Como as memórias que descrevo no meu diário.”
Ela lembrou de alguma coisa. As lágrimas que lutei contra durante toda a noite já estavam descendo pelo meu rosto.
Ela se aproximou mais... mais... e mais. Passou uma mão pelo meu cabelo. Aquilo estava mesmo acontecendo? Se eu acordasse a qualquer momento iria odiar a minha imaginação maldosa.
“Você é mesmo a melhor pessoa que já conheci e duvido muito que possa existir alguém mais bondoso que você. Quando eu li sobre a primeira vez que te vi aqui em Almerim eu entendi perfeitamente o que senti naquele dia. Porque quando eu estava no hospital e te vi novamente pela primeira vez foi a mesma coisa. Eu não precisei desses fragmentos cruéis de tão curtos da minha memória para saber o que sinto por você. Eles só me fizeram ver que eu não tenho motivo algum para fugir disso. Cheguei a conclusão que eu poderia me esquecer de você mil vezes e me apaixonar por você novamente toda vez. Eu acho até que...”
“O quê?”
“Você pode achar precipitado, mas... Eu penso em você quando você não está lá. Fico me perguntando como você está. Esperando que você não esteja com a mesma tristeza que sinto. Tem sido difícil pra mim. Esses pensamentos me alcançam sem eu esperar. E quando você aparece, eu sinto uma paz tão grande. Uma felicidade sem tamanho. Um sorriso que não sai da minha boca, mas quando você vai embora ele vai junto com você. E ainda assim nada disso se compara ao que escrevi que sentia sobre você. Não chega nem perto do que você diz sentir por mim. Se eu disser que te amo, sinto como se estivesse fazendo pouco de tudo o que tivemos. Mas eu sinto essa vontade tão grande de te dizer isso. E agora eu sinto que posso morrer se não te disser, como também sinto que vou morrer logo depois que falar.”
“Você acabou de dizer, Yasmin...” acariciei seu rosto.
“Eu te amo, Derick.”
“Também te amo, Yasmin.” Pela primeira vez o também foi dito por mim e não por ela.
Beijamo-nos. Não, eu não estava sonhando... Mesmo que uma parte de mim acredite que até hoje não fui capaz de acordar desse sonho.
*Próxima temporada: http://sosamorcolegial5.blogspot.com/